Os donos da Europa falaram


Publicado em: O Gaiense, 23 de Outubro de 2010

A França e a Alemanha assinaram esta semana, em Deauville, uma declaração sobre o governo económico da UE que é uma verdadeira proposta de certidão de óbito do princípio de igualdade dos Estados-Membros adoptado nos Tratados e uma declaração de guerra à autonomia política e aos direitos soberanos em matéria orçamental.

Merkel e Sarkozy consideram que, para levar a cabo as suas propostas, será necessário alterar o Tratado de Lisboa, que entrou em vigor há menos de onze meses, no meio de grandes e entusiasmados festejos. É verdade que mereceu severas críticas por parte de várias forças políticas da oposição, mas foi apresentado pelos seus autores e defensores como a grande solução para o bom funcionamento da UE, após anos de difíceis negociações e peripécias, que incluíram a rejeição em referendo do projecto original.

O facto de os líderes da França e da Alemanha afirmarem, com toda a naturalidade, que o Presidente do Conselho Europeu deve apresentar uma proposta de alteração do Tratado até Março de 2011 e de estabelecerem mesmo os termos e limites dessa proposta, revela uma intolerável arrogância e uma postura de poder absoluto sobre os restantes países e governos europeus.

E para que querem eles mudar o Tratado? Para ampliar o leque de sanções e para abrir a possibilidade de, para além das sanções correctivas, poderem aplicar sanções preventivas aos países cuja consolidação orçamental lhes pareça desviar-se do previsto no Pacto de Estabilidade e Crescimento. Acontece que não há sanções preventivas no Tratado de Lisboa, nem provavelmente em nenhum ordenamento jurídico de qualquer país civilizado.

Querem também introduzir a participação institucional dos credores privados dos Estados e suspender os direitos de voto dos governos dos países que apresentem violações dos princípios básicos da União Económica e Monetária.

Depois de tentarem impor o visto prévio aos Orçamentos de Estado que são votados nos Parlamentos nacionais, pretendem agora reforçar a sua tutela permanente sobre os países mais pequenos.

Haverá na Europa coragem suficiente para colocar esta gente no seu lugar?

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